24/06/08

eu não sou um gajo importante

Este país anda às avessas. Acho que todos o sabemos, mas noto que está cada vez mais azougado. Ontem, hoje, foi, são, dias de São João. E, como em quase todos os meus dias, o de ontem foi um outro daqueles alucinantes, por diversas razões, não interessam para aqui, também nem me apetece escrever sobre isso. Já reparei, claro que sim, que há festas de São João para os denominados actuais “ricos” e para os denominados actuais “pobres”. Há festas dessas em todas as ocasiões. Estamos no Brasil, definitivamente, estamos a caminhar para o terceiro mundo, aliás, já lá chegamos, as abjectas telenovelas brasileiras também a isso acudiram. Estamos numa época onde quem merece aparecer são quase sempre e só os inúteis. Nem sempre, claro. Por outras diversas razões, também não interessam, vim a casa, fui de casa, para a noite de São João, no meu carro, e tive de o estacionar a uns quantos quilómetros da “festa” que me estava destinada. Pediram-nos um vaucher para poder continuar de carro, perguntei de que tipo, o destino era mais à frente, não me tinha ocorrido que precisava de comprar um puto de um vaucher para poder continuar (não era dos que se compram, são daqueles que se arranjam, foda-se, eu já tinha comprado um vaucher para a “festa” e ainda precisava de um outro para o caminho?). E fui a pé, esses tantos quilómetros, à conversa com um dos meus melhores amigos. Fomos reparando, ao longo do trajecto, e porque o caminho era privilegiado, valha-nos isso, o rio Douro aos nossos pés, nas festas que iam acontecendo até chegar à nossa. De um lado do rio, acontecia uma daquelas festas com tendas montadas, com muitos flashes, com muito brilho, com muita artificialidade. Do outro lado, barracas montadas, oficinas de automóveis transformadas em tascas com sardinhas e pimentos assados, venda de bebidas, gelados, e mais se lembrassem, com muita autenticidade. Por mim, abancava-me logo ali, naqueles bancos de madeira corridos, a comer os pimentos e as sardinhas assadas. Mas lá fomos andando. Os denominados actuais “ricos”, os das festas, as das tendas montadas, pelo menos aos que aqui me quero referir, são, basicamente, os que aparecem na televisão, porra, aparecer na televisão é demais, dá um estatuto do caraças, basta perguntar a um atrasado mental que responde logo, foda-se, não vês que o gajo é importante, até já aparece na televisão, que importa o que faz, ganha a vida na chulice e aparece na televisão. Isto é tão logicamente aristotélico, interessa mais alguma coisa? Uma vez perguntei a um conhecido, a um daqueles que se vão cruzando no nosso caminho, porque é que um tal dos moranguitos, que também é modelo, ou vice-versa, ganhou o nosso Óscar para melhor modelo, ele que às tantas não seria o melhor modelo. Claro que a pergunta não era nada inocente. A resposta, além de ingénua, foi de tal forma confrangedora que nem mereceu contra-alegação. Pois, o gajo ganhou porque é um tipo que já fez umas merdas e tal e coisa e, chave da coisa, aparece mais na televisão. Também há aquele outro, explicou-me, que é um gajo importante, esse sim, modelo de referência, por acaso com o mesmo nome do amigo que referi, esse então é que é um gajo importante, repetiu, ganha montes de massa e aparece ainda mais na televisão. Não há vagar, não há! Estes tipos nem percebem, ou sou eu que não percebo merda nenhuma. Voltando atrás, os denominados actuais “pobres”, alegres, em plena folia são-joanense, lá se divertiam, genuínos, muitos deles a sonhar a que um dia destes talvez eles, também, consigam entrar naquelas outras festas e assim rumar em direcção ao outro lado. Acho que alguns até atravessariam a nado o rio, só para lá chegarem. Como é que lá chegaram os outros? O fogo de artifício do Porto foi mesmo alucinante, salvou a noite, assim como a companhia, o rio Douro e a "minha" “festa” tailandesa muito apropriada para uma noite como a do São João. Alucinante, tem de ser sempre. Às vezes não chegamos lá mas vale a pena tentar. E é isso que conta, o que importa. Os caminhos que vamos trilhando ficam sempre ao critério de cada um.

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