O meu pai. O meu pai é uma das melhoras pessoas que conheço. Uma pessoa digna, correcta, com fortes princípios morais, à moda antiga: um homem de carácter, um homem confiável, um homem de palavra. O meu pai. É, ainda, um homem difícil, hipocondríaco, desde sempre. E, à moda antiga, melhor pessoa para os outros do que para os de casa. Não sabe fazer melhor, vejo isso hoje. E não vai mudar, convenci-me desse facto ao longo do meu percurso até à idade adulta. Agora está doente, há uns poucos anos. Acho que sempre o foi. Agora está descalço, desprotegido, precisa de ajuda e não sabe como a obter. E nós, os de casa, não sabemos como o ajudar. A sua doença é das mais difíceis de aceitar e compreender. É um homem deprimido, um homem com cismas, um homem cansado, triste e solitário. Por opção, ou por outras circunstâncias, pois sempre foi estimado por todos os que o rodeiam, pelos de fora, pelos seus pais quando vivos (o orgulho que tinham nele ...), pelos seus irmãos, pela família da mãe. Sempre teve amigos, sempre o apreciaram. Foi um profissional exemplar, com vários louvores. O meu pai. O meu pai sempre afastou dele os de casa, a mãe, sua mulher, os filhos, eu, e a minha irmã que faleceu em 1989. Mas sempre esteve convencido, ainda está, que são os de casa que se afastam dele. Não é verdade, nem por mim o digo, sei-o pela mãe que sempre foi uma boa mãe para nós e uma boa mulher para ele. Também ela difícil, também ela cansada. Mas sempre presente, sempre pronta a ajudar e sempre pronta a dar, a nós, a mim, e a ele. Nesta época de Natal o meu pai está deitado, cansado, triste e infeliz. Sofreu vários revezes ao longo da sua vida, filho mais velho, cuidou da sua família até ao casamento, perdeu uma filha, tem um filho (eu) e uma mulher (a mãe) que não lhe dão tréguas. O meu pai. É o meu pai e eu sei que ele é um homem bom. Só não o sabe mostrar, a nós, aos de casa, aos que mais gostam dele. Eu hoje quero que ele venha a minha casa passar o Natal com a minha família, com o neto, com o rapaz que é o seu orgulho, o orgulho de todos nós. O B. é uma pessoa especial, é o filho que ele sempre quis ter, "ofereci-lho", eu, e é a única pessoa que o acalma, que lhe traz alguma paz. E é com ele, com o seu neto, com o meu filho, que eu quero que ele partilhe a noite de Natal. Se ele não vier cá, vamos nós lá. Mas seria bom que o meu pai saísse do marasmo em que se encontra. Eu não tenho nada a desculpar-lhe, seria um péssimo filho se ainda guardasse ressentimentos por factos que já passaram, por acontecimentos antigos, por pormenores escusados. O meu pai. É este, não tenho outro, não preciso de outro, tenho orgulho nele, não precisa de me demonstrar nada. Feliz Natal pai, aqui, em minha casa, ou na sua casa. Sempre estivemos tão perto e tão longe. Não vale a pena mais distâncias. Basta a sua presença, ou a minha, a nossa, presença consigo.
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1 comentário:
LINDO!
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