16/06/09

A Streetcar Named Desire

Há três peças de teatro, adaptadas ao cinema, do dramaturgo americano Tennessee Williams, absolutas obras-primas. Há outras, mas lembro-me especialmente destas três: “Um Eléctrico Chamado Desejo” (Elia kazan, 1951); “Gata em Telhado de Zinco Quente” (Richard Brooks, 1958); “Subitamente, no Verão Passado” (Joseph L. Mankiewicz, 1959). Todas estas peças de teatro foram transpostas para o cinema por grandes realizadores, génios na realização e na direcção de actores - especialmente, quanto a este último aspecto, Elia kazan, fundador, juntamente com Robert Lewis e Cheryl Crawford , do famoso Actors Studio. Todas estas peças abordam questões como a homossexualidade, o canibalismo, a castração, o desejo sexual, a frustração, o impulso animal do homem/mulher, homem/homem, como objecto de desejo e na maioria das vezes desilusão. Recalcamentos, resistência a sentimentos profundos que levam à morte ou à loucura. Nos filmes foram impostos cortes profundos em vigor no cinema americano da época, ainda hoje. Estas questões não podiam ser desenvolvidas de forma explicita. Importante, se queremos perceber bem os filmes, sem paternalismos ou arrogância intelectual, a leitura das peças, embora tudo esteja nos filmes de uma forma muito subtil. Ora, ontem, revi “Um Eléctrico Chamado Desejo”. Não é, dos três referidos, o meu preferido. “Bruscamente, no Verão Passado” é a obra-prima destas três obras-primas. Mas é um grande filme. Antes, uma grande peça de teatro pois Elia kazan não se preocupou na realização de um filme mas na transposição para o cinema de um espaço cénico. Nessa sequência, o papel primordial dos actores, da interpretação dos actores que encarnam cada uma das personagens, dos actores principais aos secundários. Por isso, a chuva de Óscares (ou nomeações para) nas interpretações principais e secundárias. A peça, o filme, desenrola-se em Nova Orleães e centra-se na personagem Blanche DuBois, vulnerável, instável, romântica, uma mulher que terá sido belíssima noutra época (sabemos que sim), em declínio, altamente vulnerável e abalada emocionalmente, profundamente abalada - Vivien Leigh sublime! Ela visita a sua irmã Stella Kowalski, casada com Stanley Kowalski, um homem rude, básico, bruto, suado, agreste, selvagem - brutal e devastador Marlon Brando! Um total confronto de personalidades, um ódio mútuo e recíproco. Aparentemente. Não é evidente a atracção física e sexual entre Blanche DuBois e Stanley Kowalski mas ela está implícita em todas as cenas. Mesmo que de maneira pouco clara (ou não). Está na peça, a censura mandou retirar. Com o desenrolar da acção percebemos que o passado de Blanche DuBois não é exactamente o que parece e intuimos que algo de trágico se vai passar. Intensa e arrebatadora, a empatia do público com a personagem Blanche DuBois vai aumentando à medida que percebemos que é uma mulher perdida e sofredora. Vítima de muitos homens, vítima de Stanley Kowalski, vítima de uma sociedade repressora, moralista e hipócrita, vitima dos outros, vitima de si própria. “Eu sempre dependi da bondade de desconhecidos”, diz Blanche DuBois. E estas coisas não mudam, são muito mais os desconhecidos que trazem bondade do que as pessoas que nos adulam. Nunca podemos depender da bondade de estranhos, sequer da bondade dos amigos ou de quaisquer outros. Mais vale dá-la. Sempre nos tornamos melhores.


A Streetcar Named Desire, 1951
Elia Kazan

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