06/10/10

Kinatay

“Kinatay” significa carnificina em filipino e será um esventramento literal e uma lição das trevas, culminando na violação colectiva e no massacre. É este o tema do filme com esse nome, “Kinatay, Brillante Mendoza, 2009, acabado de sair em DVD. Preparem-se, é um filme para maiores de dezoito anos e uns dezoito anos muito bem constituídos, organizados e estruturados. Caso contrário, é o caos, é caso para não aguentar o “murro no estômago”.
Podia começar por dizer-se, como se lê algures no filme, que uma vez perdida a integridade é para sempre. Acredito que nem sempre, mas só porque acredito na redenção. Acredito que poderá nunca acontecer pois há lugares onde isso poderá não ser possível. E neste lugar - onde acontecem estas coisas - parece que isso não existe.
A personagem principal, Peping, vinte anos, acabado de casar, com um filho de sete meses, aceita uma oferta de trabalho para ganhar algum dinheiro no próprio dia do seu casamento, na madrugada que se segue a esse dia, e vai assistir a uma verdadeira tortura, a uma matança, a um esquartejamento, e vai mostra-nos tudo isso a nós, espectadores, que o vamos acompanhar - só vemos aquilo que os olhos dele vêem.
Estamos em Manila, num nível de extrema pobreza, onde impera o caos, o lixo, o quotidiano filipino é-nos logo mostrado como nada de muito bonito mas onde, no inicio parece, se conseguirá viver com uma certa tranquilidade e harmonia. Um casal muito jovem, feliz, com um filho de sete meses, vai casar e tudo nos parece bem. Logo depois, entramos na noite de Manila, com Peping e um grupo de policias e passamos a assistir ao verdadeiro horror. Ao longo da noite, a missão em que Peping se vê envolvido consiste em dar uma grande lição a uma prostituta. E que lição! Ela vai ser espancada, violada, assassinada com facas, esventrada, mutilada e os seus pedaços vão ser espalhados pela cidade no meio do lixo, do caos, sem que ninguém se espante muito com esse facto (alguém diz, impávido e sereno, quando descobre a cabeça da mulher: “não se percebe, nos últimos tempos só encontramos pedaços de corpos pela cidade”).
E aqui não há integridade, não há redenção, há um desfilar de actos bárbaros, sem dó nem piedade, uma frieza implacável. A excepção é a personagem principal, Peping, que não recusa a tal oferta de trabalho para ganhar algum dinheiro. Parece que ele, também ele, não se irá salvar. Ele próprio, irá ser como o grupo com quem passou aquela noite. Para ele a salvação não vai chegar, parece. Ou a chegar será de acordo com aquelas regras.
Tudo é irremediavelmente mau quando se vê este filme. É como alguém nos dissesse (neste caso, o realizador) : o mundo é mau, o mundo é muito mau, e por ser tão mau olhem para isto, vejam bem isto! Será que foi isto que quis dizer Brillante Mendoza, com este “Kinatay”, melhor realizador em Cannes 2009 ? A mim parece-me que sim. Só não sei se isso é mau ou se às vezes é bom ver que existem coisas realmente más.

“Quero que os espectadores sintam o horror dentro da cabeça do meu personagem. Quero que o sigam de perto, que observem e pensem, e se sintam realmente perturbados.”
Brillante Mendoza

1 comentário:

Pedro BM disse...

Excelente. Lá vou ter de despender mais uns euritos... E estive com isto na mão, no pack com o Lola. Mas fiquei com receio e não trouxe. Que burro fui...