06/03/11

Hereafter


O que impressiona em “Hereafter”, último filme de Clint Eastwood, suponho, não é bem o filme, antes pelo contrário, mas o próprio Clint Eastwood. Um homem com uma sensibilidade única, apesar do que aí vem. O tema é o sobrenatural, o início do filme é muito prometedor, as histórias cruzadas da vida de três pessoas em três cidades distintas (Paris, Londres e São Francisco) muito interessante, mas o desenvolvimento posterior não tem emoção nenhuma. Percebe-se algum esforço de Clint Eastwood na realização mas o argumento de Peter Morgan é fraco, chega a ser confrangedor. É mesmo banal. O enquadramento de acontecimentos reais (o tsunami do Sudeste Asiático, 2004; os atentados ao metro de Londres, 2005) na narrativa soa a mais do que forçado. É pretensioso, falso e aborrecido. E depois há ainda o canastrão do Matt Damon. Indescritível. Uma múmia interpretaria melhor a personagem. Uma curiosidade interessante, aliás em contraposição absoluta com “Gran Torino”, um dos mais belos finais da história do cinema de todos os tempos, neste “Hereafter” temos precisamente o oposto: um dos finais mais banais e previsíveis e daqueles que já se sabem que poderiam ser assim mas que se está espera que não sobretudo porque o filme é de Clint Eastwood. Mas é. É é uma seca brutal.

22/02/11

Arena

A realidade portuguesa, um bairro social em Lisboa, pormenores do quotidiano na história de um rapaz em casa com pulseira electrónica por causa de uma dívida ridícula de poucos euros. Uma realidade bem presente nos nossos dias, bem ao nosso lado (o Porto, por exemplo, está cheio de bairros destes), onde já não existe esperança. Para quase todos; esperemos que para uns ainda exista. Estes rapazes preenchem o dia-a-dia dos tribunais portugueses e percebemos que depositar neles alguma esperança já não é ausência de fé mas sim já um verdadeiro acto de contrição. E é uma realidade dolorosa, esta de perceber que não há esperança para acreditar na esperança de a ter.
Arena, 2009
João Salaviza

05/02/11

Another Year



Este é o filme mais humano que vi nos últimos tempos, nos últimos meses, sendo certo que este ano já vi (e há) muitos e bons filmes.
Este é o filme que merecia todas as nomeações, muitos prémios, sendo certo que não teve quase nenhuns (é candidato ao Óscar de melhor argumento, é o mínimo).
Este é um filme que nos faz pensar que é nas coisas triviais que podemos alcançar e buscar alguma felicidade (o filme é um alerta; não é uma catarse sobre a infelicidade).
Mike Leigh traz-nos personagens deveras deprimidas para nos esclarecer que as pessoas infelizes podem ser menos infelizes afinal e só com coisas simples. Às vezes não sabem. Às vezes pode ser muito difícil. Às vezes é impossível.
Este é um olhar inteligente e profundamente humano de Mike Leigh com interpretações primorosas de todos os actores (Lesley Manville merecia ser candidata ao Óscar).
Este é um filme imperdível.
Life is very long, when you´re lonely.

23/01/11

Les Amours Imaginaires


Il n´y a de vrai au monde que de déraisonner d´amour .
- Alfred Louis Charles de Musset
Interessante perspectiva sobre o amor, sobre como viver o amor, sobre como se apaixonar e sobreviver às paixões, diálogos extraordinários, inteligentes e criativos, cores fortes, roupas modernas e cenários retro, músicas que metaforizam as vezes em que não é possível o amor, aprender e ironizar com isso, sentido de humor e sobretudo simplificação. Xavier Dolan nasceu em 1989 e vai fazer filmes (ainda) mais interessantes quando deixar de se centrar tão nele próprio.
"Les Amours Imaginaires"
Xavier Dolan, 2010.

02/01/11

Morrer Como um Homem

"Morrer Como um Homem", de João Pedro Rodrigues, foi considerado um dos 10 melhores filmes do ano pela revista francesa Cahiers du Cinèma (em 7º lugar). “Morrer como um Homem" é um filme perturbador, que vai do sublime ao mediano em menos de nada, uma tragédia portuguesa, o nosso triste fado, o melodrama do desgraçadinho, coitadinho e pobrezinho - ainda por cima travesti e homossexual, uma tragédia existencialista do amor abnegado e transcendente. Contudo, João Pedro Rodrigues faz filmes que não se parecem com nenhuns outros filmes e este é um filme que atinge alvos: amor e morte, sexo transgressivo e violência, fé e a religião, o desalento total dos personagens - ou não fossem esses mesmos portugueses. Diz o realizador que é uma tragédia, uma tragédia clássica, um personagem que não consegue fugir ao seu próprio destino. Podia ser, não fosse o filme demorar-se tanto em pormenores e em tantas cantorias. Cada filme seguinte de João Pedro Rodrigues é um melhor filme e fica-se assim sempre à espera do próximo.